Quando Sabrina Regiane Colla, 33, formou-se em Propaganda e Marketing, o
mercado de trabalho não estava muito bom. O ano era 1998 e ela não conseguiu um
espaço na sua área de formação. E esse fato foi decisivo para que hoje ela atue
como guia de turismo. Sabrina não é a única que trabalha em uma área distinta da
de formação.
Essa realidade é mais comum do que se imagina e diversos fatores ajudam a
compor o cenário. “Muitas vezes, após formados, os profissionais não encontram
oportunidades no mercado”, afirma a consultora em Recursos Humanos do Grupo Soma
Desenvolvimento Corporativo Jane Souza. Além disso, muitos profissionais já
desistem de atuar na área de formação antes mesmo de terminar a faculdade, por
já estarem em outra área ou mesmo por descontentamento. Para o diretor executivo
da Ricardo Xavier Recursos Humanos, Marshal Raffa, mesmo descontentes, muitos
profissionais continuam estudando para completar a formação.
O descontentamento foi o principal motivo que levou Rita Santander, 31, a
desistir do Jornalismo. “Desde que eu me formei, não tinha encontrado um
trabalho que me satisfizesse”, afirma. Formada em 2002, ela começou a mudar de
área em 2005, quando foi chamada para ser sócia em um estúdio de fotografia. E
hoje, ela é artesã. “Esse era um projeto antigo”, diz Rita.
A realização pessoal também é apontada pelos especialistas como um motivo
para a existência de tantas pessoas trabalhando em um mercado tão diferente
daquele de formação. Esse fator também pesou na decisão de Sabrina. “Eu já tinha
essa ideia de ser guia antes mesmo de me formar em Publicidade”, conta.
Aproveitando oportunidades
A união de mercado saturado, desejos não realizados e talentos escondidos
criam, na avaliação dos especialistas ouvidos, um contingente de profissionais
que atuam em uma área mesmo graduados em outra. E isso é ruim? Não. Diante de
situações difíceis, buscar outros caminhos (e se dar bem) é sinal de
versatilidade.
“Sempre temos de buscar alternativas e o profissional que está nessa situação
pode tentar alinhar pontos em comum entre as áreas de formação e de atuação”,
explica Jane. “Ele não precisa jogar essa formação fora e, dependendo da área em
que ele atua, isso pode ser até um diferencial”, completa a consultora.
O diretor da Ricardo Xavier lembra que o mercado está em constante mudança.
“E mudanças criam oportunidades”, diz. “Isso permite, muitas vezes, no meio do
caminho, descobrirmos talentos escondidos”, ressalta Raffa. Para ele, não
existem tempos perdidos e, assim como reforça Jane, aliar os conhecimentos
teóricos, adquiridos na faculdade, com a prática de outra área só agrega ao
profissional.
Rita sabe bem o que isso significa. Ela aproveitou a oportunidade de ser
sócia de um estúdio de fotografia e só ganhou com isso. “Com o tempo livre que
tinha, comecei a me dedicar mais ao artesanato”, afirma. Sabrina também não se
desesperou pelo fato de não ter conseguido uma colocação na área de formação.
Depois de formada, ela abriu uma franquia e atuou nesse mercado por oito anos.
Só depois de ter adquirido um pouco mais de estabilidade econômica começou a
investir no desejo de ser guia de turismo.
Para as duas, o conhecimento adquirido na faculdade só as ajudou a trabalhar
melhor hoje. “O Jornalismo ajudou muito na questão do modo de tratar as pessoas,
a me comunicar com elas”, afirma Rita. “Até para criar um produto viável, a
faculdade me ajudou muito. Minha formação não foi perdida”, completa a artesã.
E ainda que os profissionais não utilizem os conhecimentos vistos na
faculdade, eles formam uma bagagem cultural importante não só para a carreira
como para a vida pessoal. “Toda a informação transformada em conhecimento se
torna capital intelectual”, reforça Raffa. “É possível tirar proveito de toda
essa informação de alguma forma. Esse conhecimento pode ser um facilitador em
alguma situação. No mínimo, é um agregador”, completa.
A hora de voltar
Sabrina e Rita estão contentes com o que trabalham hoje e nem pensam em
voltar para as profissões de graduação. Mas, se vários fatores fazem muitos
desistirem (às vezes, forçados) de atuar na área de formação, outros tantos
fazem com que profissionais queiram retornar às origens. Contudo, o caminho para
eles é mais difícil que para um recém-formado. “Essa questão é delicada”, diz
Raffa. O diretor da Ricardo Xavier explica que é preciso cuidado ao querer
voltar depois de uma longa experiência em outras áreas.
Isso porque o mercado pode encarar esse profissional como uma pessoa versátil
ou como alguém que ainda não sabe o que quer, cuja carreira ainda não tem foco.
“É uma questão que a gente levanta durante o processo de seleção”, afirma Jane,
do Grupo Soma. “Durante as entrevistas, vemos se essa situação decorreu por
questões pessoais ou por indecisões e, assim, conseguimos perceber se existe
consistência no entrevistado”, reforça.
“O que de fato ele quer?”. Para Raffa, essa é a primeira pergunta que o
profissional deve fazer antes de deixar o trabalho atual para tentar entrar na
área de formação. Depois disso, é preciso observar o mercado - para perceber se,
de fato, existem oportunidades - e se atualizar. “Essa volta é possível, mas
quem quiser fazer isso tem de entender que vai competir com profissionais que já
estão na área”, lembra Jane.
“Ele deve buscar o mercado ciente de que vai voltar em um patamar abaixo”,
diz Raffa. Isso significa uma remuneração menor que a atual. Por isso, para
aqueles que se encontram nessa situação, Jane aconselha a fazer uma análise da
situação financeira.